sexta-feira, junho 27, 2025

 


Lyra

Cidade de Violet, Johto

Terça-feira, 3 de maio



O ginásio de Violet estava fechado. Fechado. Trancado. Cerrado. Inacessível. Todos os sinônimos possíveis para dizer que o ginásio estava completamente fechado para qualquer desafiante. Depois que tinham almoçado, eles tinham ido ao ginásio naquela mesma rua apenas para encontrar um cartaz laranja nas portas falando que o líder estava ausente e não voltaria até a semana seguinte, o que frustrou Pierce, por que ele queria ver Lyra desafiando o ginásio.

— Que anticlimático — diz Ren, com as mãos na cintura.

— O que vamos fazer agora? — pergunta Luca que segurava uma incubadora de acrílico que ele havia ganho de Mr. Pokémon junto de um ovo estranho, Pierce se questionava do porquê o avô havia dado um ovo ao irmão ao invés de dá-lo um Pokémon — A gente tinha vindo justamente ao ginásio e bam, fechadão.

— Podemos ir a uma das instalações da fronteira, eu soube que há uma aqui em Violet — sugere Pierce, ele ainda tinha que se registrar para o Desafio da Fronteira e se preparar para o que viria na primeira das cinco instalações de batalha espalhadas por Johto.

— Ah, aquela coisinha da Batalha da Fronteira — lembrou Lyra.

— Não é como se tivéssemos muito o que fazer — fala Ren — Onde exatamente fica?

— Não vi direito no meu VS Recorder, mas acho que é ao norte de Violet, dá para ir de ônibus — disse o garoto — Não deve ser longe daqui.

Era longe. Bem longe, o ônibus havia levado cerca de quarenta e cinco minutos para levá-los ao distrito norte de Violet onde, no VS Recorder, apontava a instalação da Batalha da Fronteira, mas quando desceram do ônibus eles apenas depararam-se com uma fábrica que parecia evidentemente abandonada.

O pátio da fábrica estava abarrotado de maquinário abandonado, tambores de latão, vigas de metal enferrujadas e tábuas de madeira inchadas e apodrecendo, tudo largado e abandonado, ele se questionava se estava no local correto apontado no mapa do VS Recorder ou se não tinha sido enganado.




— Tem certeza que é aqui o lugar? — perguntou Lyra. — Parece…

— Um lixão — completa Ren.

— Lixão é apelido — diz Luca — Aqui é um foco de tétano e cólera, eles te enganaram, irmão.

— Não enganaram não — disse uma voz, era feminina e aguda — Aqui é uma das instalações da Batalha da Fronteira. Um dos muitos pólos da Fábrica da Batalha, isso é apenas um falso chamariz.

Os quatro viraram-se e viram de quem vinha a voz, tratava-se de uma menina baixinha de cabelos rosa-escuros presos de um jeito incomum, uma mecha terminava em uma maria-chiquinha solitária que caia pelas costas enquanto a outra estava presa em um aro que ladeava sua cabeça, ela deveria ter a idade de Luca, por volta de doze ou treze anos pela altura e fisionomia. Acompanhando-a estavam um Kadabra que flutuava logo atrás dela.



— Desculpa se assustei vocês, meu nome é Mira — ela se apresentou — Mira Greene. Eu também sou uma Desafiante da Fronteira, vi vocês descendo do ônibus e vindo até aqui.

— Nada stalker, hein — diz Luca e Mira fica um pouco corada.

— De-desculpa — disse, cabisbaixa — Mas estão aqui pela Batalha da Fronteira, ?

— Na verdade, eu estou — disse Pierce — Eu sou um Desafiante da Fronteira.

— Que legal, eu quase não conheci nenhum aqui em Johto desde que cheguei — ela sorriu — Parece que a Batalha da Fronteira não é tão popular assim por aqui igual é de onde eu vim.

— Você é de onde? — pergunta Lyra.

— De Sinnoh — diz Mira em resposta — Eu não consegui me inscrever para a temporada da Batalha da Fronteira quando estava por lá porque eu era muito nova.

— Você ainda parece muito nova — menciona Ren.

— Eu fiz treze anos em março, só sou baixinha! — diz a garota — Não é essa a idade mínima para se tornar uma treinadora pelos protocolos regionais de Kanto e Johto?

— Errada ela não está — responde Lyra — Mas voltando ao que você disse antes, como isso aqui é um falso chamariz?

— As instalações da Batalha da Fronteira são bem escondidas, não são prédios óbvios como os ginásios ou estádios de competição, você só vai descobrir quando chegar a uma delas pelo mapa no VS Recorder.

— E quanto à Torre de Batalha? — perguntou Pierce, ele se lembrava que o prédio onde ficava a Torre de Batalha era localizado em Olivine, uma grandiosa construção de ferro e metal que torreava sobre a cidade litorânea. — Tipo, é uma torre de mais de cinquenta andares, não tem como passar despercebido.

— A Torre já estava em Johto antes da Batalha da Fronteira vir — explica Mira — Quando a temporada de Johto acaba, a Torre funciona normalmente, mas quando a Batalha da Fronteira retorna, o Magnata da Torre a assume, simples. Achei que todos que desafiassem a Batalha da Fronteira soubessem disso.

— Nem todo mundo é aficionado por ela — brinca Ren — Mas e aí, como a gente faz pra entrar? É só chegar chegando ou…

— Tem uma entrada secreta, só checar no VS Recorder — disse Mira.

Pierce pegou seu VS Recorder e abriu o aplicativo do mapa e checou as dependências daquela fábrica, o pátio e o prédio abandonado e seus galpões poeirentos, não havia sinal claro de uma entrada exceto por…

— Um contêiner! — ele exclamou — A entrada é num contêiner de carga!

Os cinco adolescentes, em passos apressados, foram correndo até onde ficam os contêineres, haviam muitos, alguns vermelhos, outros amarelos, alguns carregados de ferrugem e com a vegetação tomando conta, mas um azul-claro destacava-se entre os demais. Pierce e Mira foram correndo mais a frente e se depararam com uma porta na lateral do contêiner que abriu-se automaticamente ao detectar a presença deles.

Estupefatos, ambos entraram, sendo acompanhados por seus amigos. Dentro do contêiner tudo parecia maior e até mais limpo que o exterior, um balcão de informações com dúzias de telas holográficas se destacava ali naquele saguão com poltronas e plantas artificiais.

Vindo na direção deles, uma mulher em seus vinte e poucos, emergiu de trás do balcão e caminhou na direção dos cinco. Ela tinha cabelos pretos e usava um vestido azul e branco, os braços estavam posicionados em frente ao corpo e em seu rosto um sorriso apresentava-se gentil, embora parecesse mais um sorriso estampado que um genuíno.

Pro valentibus, sic itur ad astra! Bem-vindes à Fábrica de Batalha — disse ela, sua voz robótica — Sou Fab-IA, sua recepcionista e assistente virtual nesta e em outras instalações da Batalha da Fronteira. Em que posso ajudá-los?

— Viemos para nos registrar — disse Pierce.

— Certo — disse Fab-IA que abriu seus braços e uma luz azul veio de seus olhos, uma tela e um teclado holográfico projetaram-se e se dividiram em dois — Detecto a presença de dois VS Recorders, aos desafiantes que desejam enfrentar a Fábrica de Batalha, preencham seus dados e confirmem as informações antes de enviarem ao sistema da Fábrica.

Tanto Pierce quanto Mira assim o fizeram, eles preencheram cada lacuna com seu ID de Treinador, nome, todos os dados que constavam em seus VS Recorders, ao fim eles apertaram a tecla Enter holográfica e tanto o teclado quanto a tela sumiram quando Fab-IA piscou seus olhos.

— Percival Jaymes Featherstone. Quinze anos. Nativo de Cherrygrove, Johto. Originário de Hammerlocke, Galar. ID de Treinador nº 542772 — ela disse em voz alta — e Mirandina Pesselle Greene. Treze anos. Nativa de Oreburgh, Sinnoh. ID de Treinador nº 664455. De acordo com o sistema, ambos possuem um total de zero estampas comemorativas da Batalha da Fronteira, o que faz deste desafio o primeiro de vocês, correto?

Ambos assentiram com a cabeça.

— Como devem saber a Fábrica de Batalha funciona do seguinte modo: não poderão usar os Pokémon que detém em mãos — a assistente virtual começou a explicá-los — Todos os Pokémon utilizados dentro das instalações são emprestados ao desafiante, podendo trocá-los conforme avançam pelo desafio que consiste de perguntas de tópicos variados a fim de testar o conhecimento dos desafiantes, caso errem as respostas automaticamente terão que desafiar um treinador holográfico de inteligência artificial e caso vença-o, prosseguir. Ao somar quatorze perguntas respondidas corretamente ou quatorze batalhas vencidas, o desafiante poderá desafiar o Chefe da Fábrica. Compreenderam?

Novamente, os dois assentiram.

— O desafio de ambos estará agendado para o próximo dia dez de maio — disse ela por fim — Compareçam às instalações da Fábrica às nove da manhã em ponto. Aos acompanhantes, peço-os que apenas assistam de uma sala para que não interfiram no desempenho do desafiante. Boa sorte em seus desafios.

— Bem, acho que eu tenho que começar a treinar então o quanto antes — fala Mira acenando — Te vejo dia dez, Piercezinho. Eu vou vencer!

— Não se eu te derrotar antes, Anã de Jardim!

Mira sai do galpão e, em seguida, a assistente virtual, fecha os olhos e curva a cabeça, como se desligasse, permanecendo imóvel ali no saguão. Pierce não questionou, mas ele não podia negar que a Batalha da Fronteira havia investido bastante em tecnologia em comparação a tudo que tinha visto até então.

— E agora, o que faremos?

Lyra puxou seu PokéGear e digitou algo e mostrou para os amigos algo. Era o cartaz de um café com temática de Meowth que havia sido inaugurado ali na cidade de Violet.

— Que tal irmos no Café Scratch?





Aleks


Ele não conseguia se livrar daquele amargor na boca e não era do café que ele estava se referindo. Desde manhã cedo ele e a outra garota da agência, uma coordenadora chamada Emmeline Highsmith, estavam no Café Scratch gravando uma série de vídeos publicitários como parte do que seu manager havia combinado com a rede de cafés e no meio-tempo ele tinha aproveitado para se aproximar da sua nova colega de trabalho, mas ela não era nada o que parecia.

Ugh, detesto esse lugar — ela havia dito depois de terem gravado o terceiro comercial — O cheiro desses Meowth está atacando minha alergia! E o café tem gosto de água suja! Eu não sei por que concordei em gravar essas publis, hein?

À essa altura ela só queria algo para reclamar, nada estava bom para Emmeline. A maquiagem irritava sua pele, a luz usada não era a apropriada, as cabeleireiras não sabiam como arrumar seu cabelo e assim ia, uma reclamação atrás da outra o que os atrasou para gravar os comerciais e os vídeos publicitários em duas horas e meia, deixando Aleks à mercê de mais reclamações, mas estas vindas de Gideon Navarre, seu manager.

— Eu reuni os dois para esse trabalho, por que eu acreditei que ambos pudessem ter uma certa sinergia — disse Gideon, seus braços cruzados contra as costas. — Mas nada apetece a Emmeline e quanto a você, Aleksey…

— O que tem eu? — ele perguntou ao manager.

— Não tenho comentários negativos quanto à sua performance — responde o manager, seus olhos encarando o idol, Aleks sentia o frio subir a espinha com mil agulhinhas de gelo. — Naomi e os investidores farão uma curadoria do material gravado, mas tenho que dizer que esperava que você e Emmeline por estarem numa mesma situação poderiam… Como é a palavra?

O homem de terno tocou o lábio tentando lembrar-se. Aleks virou-se de costas e viu Emmeline, seus cabelos loiros cascateavam pelas costas da cadeira enquanto ela fazia posts para as suas redes sociais, vídeos curtos e tudo mais elogiando o estabelecimento quando era mentira. Ele engoliu em seco.

— Bem, deixe para lá… — deu de ombros. — Você e a senhorita Highsmith são os únicos coordenadores agenciados em nossa empresa de entretenimento que ainda não conseguiram uma fita sequer e isso está gerando certo burburinho nas redes sociais fora que o público anseia por novas capturas e eu andei pensando em algo…

— No quê, Sr. Gideon?

— Tenho um conhecido, um homem que trabalha como capturador profissional — começa o manager — Ele é um dos melhores no ramo e eu pensei que talvez tanto você quanto a senhorita Highsmith pudessem ter novos Pokémon para os concursos. Os custos pelos serviços desse capturador viria da própria Karakuri e eu até posso deixar que escolham o Pokémon, mas em troca eu terei que pedir que tanto você quanto Emmeline não apenas cheguem nas finais do próximo concurso, mas que ganhem.

Aleks engoliu em seco. Ele conhecia uma coisa ou outra sobre capturadores profissionais, era uma profissão em ascensão, embora não reconhecida como uma classe de treinadores pelos órgãos da Liga Índigo ou do Comitê da Fita de Kanto-Johto, já que as pessoas pagavam para que terceiros fizessem a captura de um Pokémon específico por um preço o que poderia se qualificar como tráfico de espécies e não seria muito diferente do que algumas organizações criminosas como a Equipe Rocket e caçadores ilegais que lucravam rios de dinheiro com o tráfico de espécies raras como Dratini, Cubone, Scyther, Pinsir, Clefairy, Eevee, dentre muitos outros na região de Kanto no mercado ilegal.

Ele não queria que outra pessoa capturasse um Pokémon para ele. A coisa toda de ele querer sair em jornada se tratava de ele mesmo capturar seus Pokémon, de treiná-los e coordenar seus movimentos em uma combinação de golpes únicos que o levaria até o Grande Festival. Seu manager e a CEO da empresa haviam permitido-o que ele poderia sair em viagem pela região de Johto então não era nada mais que justo deixarem-o capturar os Pokémon que ele quiser.

— Mas, senhor Navarre… — Aleks não encarou Gideon nos olhos, ele sempre evitava, tinha um medo absurdo do homem — E-eu… — ele não sabia como expressar para o seu manager o que queria dizer, sabia que já estava sendo muito abusado apenas por ter pedido a Naomi para sair em viagem e tudo mais, ele estava em gelo muito fino. — Eu gostaria de saber se eu posso eu mesmo capturar um Pokémon novo para o próximo concurso?

— Tem certeza? — indaga o homem — Este meu conhecido pode trazer Pokémon que te garantiriam uma fita facilmente. Um Milotic, talvez um Pachirisu, uma Hatterene ou uma Florges, estes são Pokémon populares nos palcos de concurso em Hoenn e Sinnoh e nas exibições na região de Kalos e Galar.

— Tenho certeza sim — ele assente.

— Vou deixar a opção em aberto — diz Gideon — Mas me apareça com este Pokémon antes do final deste mês, já fiz questão de que fosse inscrito em outro concurso.

— Mas já?

— O calendário de concursos do Comitê já definiu as últimas cidades em Kanto e Johto deste mês — diz Gideon — Aqui em Johto haverá um concurso em Blackthorn e outro em Azalea nas próximas semanas, eu quis te dar uma colher de chá e te poupar de subir a serra nevada e pedi para que fosse inscrito no de Azalea. Não me decepcione.

Ele assentiu com a cabeça.

— E ah, quanto a Emmeline

— Sim, o que tem ela?

— Tente se aproximar dela — diz o manager. — As reclamações dela podem acabar amargando qualquer publicidade futura e parceria e eu queria que alguém como você tentasse amaciar ela, ser amigo dela e tudo mais. Compreende?

Aleks balança a cabeça confirmando que sim. Gideon então vira-se e vai em direção à porta, saindo em seguida. Emmeline também não parecia estar em lugar nenhum do café, deveria ter saído também quando ele e o manager estavam conversando. Céus, e agora, como ele faria para se aproximar de alguém como Emmeline?

Ele suspirou e se sentou em uma das mesas do café e puxou seu celular do bolso da calça e pensou em mandar mensagem para a sua namorada quando algo acabou desviando a sua atenção.

O tilintar da porta do café o desviou os olhos de seu celular, fazendo com que ele encarasse quem vinha pela porta, eram três adolescentes: uma menina e três meninos. O quarteto era familiar a ele, eram Ren e seus amigos que ele havia conhecido em Cherrygrove poucos dias atrás, era surpreendente ver eles ali naquele café de todos os lugares em Violet.

Mais surpreendente era ver Pierce ali, ele continuava o mesmo. Tá, talvez não exatamente o mesmo, já que ele havia tido um estirão de crescimento desde que tinham doze anos e ele havia deixado o cabelo crescer, fora as roupas que ele usava. A camisa colada ao corpo, os jeans skinny com rasgos estilosos, os tênis converse, os piercings removíveis no lábio, tudo gritava uma estética selvagem e rock n’ roll que se adequava a ascendência galariana do menino. Ele parecia muito legal, uma pena que ele ainda nutrisse um ódio anormal por Aleks por conta do que aconteceu há alguns anos atrás.

— Eu mereci — ele fala baixo enquanto guarda seu celular no bolso da blusa.

Ele arfa e apenas observa de longe aqueles quatro.

— Esse café é muito popular em outras regiões — havia dito Lyra, a menina de marias-chiquinhas que era uma de suas fãs e parecia eufórica quando o conheceu em Cherrygrove, ele não conseguia esquecer daquele rosto cheio de sardas. — Principalmente por conta dos Pokémon felinos. Eu sempre quis ir em um desses cafés, ainda mais que o tema aqui em Kanto e Johto são Meowth!

— Você realmente gosta de Pokémon gatos, hã? — riu Luca, o meio-irmão de Pierce que vestia-se com um moletom que cobria apenas a parte superior de seu tronco e que emulava a aparência de um Lucario.

— Meowth é um dos meus Pokémon favoritos — dissera Lyra — Sempre quis ter um, mas meu pai é alérgico.

Putz — acrescentou Ren, seus cabelos fúcsias caíam sobre seu rosto em uma cortina cobrindo um de seus olhos, ele destacava-se um pouco entre os demais, embora sua escolha de roupas acabasse casando com as que Pierce usava — Minha mãe é um caso oposto, ela detesta Pokémon gatos, ela é uma pessoa mais canina, só tolerou meu Houndour por que é um cão, se fosse um felino como um Meowth ou um Espeon ela surtava.

Eles riram.

— Poderíamos pedir algo, depois daquele vai-e-volta no ônibus para cá deu até fome — fala Pierce apertando o estômago demonstrando que estava faminto — Recomenda algo, Ly?

— Tem um bolo que eu sempre quis provar — ela fala para os amigos — É feito com apricorns e berries. Sempre vejo falarem bem na internet, então deve ser bom, não é?

Luca deu de ombros. Aleks achou as reações muito engraçadas, apenas observou-os, talvez ele se aproximasse, Pierce não poderia ser tão amargo assim, aquilo havia acontecido, tipo, quatro anos atrás, ninguém guardava um rancor por tanto tempo assim, embora Luca havia dito que o garoto o odiava muito ainda o que fez ele ficar com o pé atrás.

— Será que me arrisco?

Ele se arriscou. Ele se levantou de sua cadeira e foi em direção à mesa onde estavam os quatro que haviam acabado de ser atendidos por uma garçonete. Do alto de uma prateleira um Meowth encarava Aleks, o felino tinha marcas de brigas e pelos arrepiados, enxergava apenas com um olho e com apenas aquele olho ele julgava Aleks severamente como se dissesse “Você vai se arrepender depois”, mas no máximo o gato soltou um miado e o acompanhou até a mesa de Pierce e seus amigos.

Reunindo toda a coragem necessária, ele caminhou até a mesa e deu um sorriso prazenteiro, ninguém podia nutrir tanto ódio por muito tempo, era como uma represa segurar água por tempo demais, uma hora ela iria romper e causar um desastre de proporções gigantescas.

— O-oi — gaguejou enquanto se aproximava.

O Meowth pulou no colo de Lyra e ali se ajeitou, ronronando enquanto encarava Aleksey com seu único olho julgador. Por que gatos eram assim?

— Aleks?! — disseram Ren e Lyra em uníssono, surpresos de vê-los ali, já ele, por outro lado, não via tanta surpresa assim já que naquela tardinha ele já tinha encontrado tantos fãs que encontrar com mais dois não seria surpresa nenhuma para ser sincero.

— O que está fazendo aqui? — perguntou Luca.

— O que está fazendo aqui pergunto eu — Pierce devolve a mesma pergunta, mas com um tom mais sulfúrico. — O principezinho perfeito não deveria estar por aí fazendo coisas de celebridade? Talvez espalhando fofocas como sempre faz!

— Não vamos começar a brigar, por favor — intervém Ren, Aleks nunca tinha reparado antes, mas para um menino ele tinha olhos muito bonitos, verdes da cor das primeiras folhas das árvores na primavera — Pierce, eu sei que tu odeia o cara, mas por favor, para que tá feio, cara!

Humpf — bufou ele, erguendo o queixo, evitando encarar Aleks — Mas ainda não respondeu a pergunta: o que faz aqui?

— Hã, eu estava gravando uns materiais para esse café — ele responde ao aminimigo — Um comercial para a tevê e uns anúncios para a internet e tudo mais, foi o que meu manager combinou comigo depois do que aconteceu no último concurso.

— Oh, o que você perdeu — diz Lyra enquanto o Meowth em seu colo ronrona, esfregando-se nela.

— É… — ele olhou para a mesa, não encarando ninguém nos olhos — Se importam se eu me sentar com vocês? Eu estou com um tempinho livre e, sei lá, vi vocês aqui e achei que seria legal bater um papo com alguns amigos antes de voltar para o Centro Pokémon.

— Somos amigos? — pergunta Ren com certo rubor nas bochechas, era fofinho até o contraste contra a pele acastanhada dele.

Eu não sou seu amigo, Aleksey — afirma Pierce. — Você sabe bem disso.

— É, é eu sei, mas podemos ser aminimigos. Amigos que também são inimigos, uma sugestão aceitável, não?

Pierce esgueirou seu olhar e assim como o Meowth no colo de Lyra, ele silenciosamente julgou-o. Antes que ele pudesse abrir a boca a garçonete tinha vindo trazer os pedidos dos demais adolescentes, trazendo fatias de um bolo coberto com glacê rosado e um recheio de Pecha Berry entre as camadas e bebidas diferentes; para Lyra e Luca, ela havia trago um milkshake de apricorn com calda vermelha, confeitos e chantilly enquanto Ren tinha um bubble tea, já Pierce, para ser anticlimático e blasé, pediu um café preto e sem açúcar.

— Você não vai comer nada? — pergunta Ren olhando para Aleks, que por mais que estivesse um pouco faminto, assentiu negativamente com a cabeça.

— Não, eu comi mais cedo — responde o idol — Mas vamos mudar o assunto, o que fazem aqui em Violet?

— Ah, eu vou desafiar o ginásio — fala Lyra entre garfadas — Mas o líder está ausente, então é bom que eu vou ter tempo para treinar.

— Oh, que péssimo, mas ao mesmo tempo bom — Aleksey morde a parte interna da bochecha.

Ele não entendia muito bem como funcionava batalhas de ginásios ou o sistema da Liga Pokémon. Seu irmão mais velho, Artemy, já havia competido na liga no passado, ele quem deveria ter mais conhecimento a respeito, mas Aleks não tinha contato com Artemy mais já que o próprio escolhera se afastar da família alguns anos atrás desde que começara o trabalho na nova empresa.

— Nunca vi uma batalha de ginásio antes — comenta — Se eu estiver com algum tempo livre, poderia vê-la, Lyra?

O rosto da menina enrubescer, ela deixou o garfo cair. Aleks não podia evitar não dar um sorriso bobo, ele inevitavelmente tinha esse efeito nas garotas, principalmente as suas fãs, mas por conta de toda a coisa de ser idol, ele não podia se relacionar com nenhuma delas, então ele mantinha seu namoro com Heather em segredo do olhar público.

— Po-po-pode… — ela gaguejou, as sardas em seu rosto se destacavam entre a vermelhidão das bochechas, o Meowth no colo de Lyra encarava o coordenador com seu único olho bom, ainda julgando-o. — Pode sim.

— Bem, se quiser posso passar meu contato para você e podemos ver um dia na minha agenda — continua o idol com os olhos fixos no grupo de adolescentes — Aliás, e vocês outros, o que vão fazer em Violet?

— Batalha da Fronteira — respondeu Pierce, friamente, sendo direto. — Não que você vá entender.

Ele revirou os olhos.

— E você, Ren?

O garoto de cabelos fúcsia coçou o pescoço, o rosto também corado como o de Lyra, mas os olhos verdes dele não encontravam com os de Aleks. Ele deu um pequeno risinho.

— A-ainda não sei — respondeu, um tanto enervado — Ainda não… não sei o que pretendo fazer.

— Bem, Violet tem mil e uma coisas o que fazer — diz Aleks — Tem a Torre Brotinho, ela é tipo, o edifício em madeira mais velho de Kanto e Johto, quiçá do mundo, e possui uma pilastra central que pode suportar terremotos de até 9.1 na Escala Richter!

— Que papo de nerd — cochicha Luca.

— É… realmente — ri Aleks — Minha tia é guia turística, então eu acabo sabendo essas coisas. Sempre é bom descobrir mais sobre os lugares que visitamos, mas acho que eu recomendo mesmo o sítio arqueológico a sudoeste de Violet, é de uma antiga civilização que precedeu a Johto moderna.

— Nem me fale disso — comenta Pierce. — A escola marcou uma excursão para lá, mas não pude ir. Por conta das minhas alergias sazonais. Todo mundo foi e eu fiquei, com a cara toda constipada por que a rinite atacou.

Ele se lembrava disso, afinal estivera na mesma excursão às Ruínas de Alph, era numa época em que Pierce e Aleks ainda eram amigos próximos e antes daquela briga feia que havia feito eles pararem de ser amigos, tudo por que o coordenador espalhou uma mentira entre seus colegas de escola envolvendo Pierce e seu pai, um criminoso altamente procurado pela Polícia Internacional. Ele deu um breve suspiro e mirou o aminimigo, ele entendia o porque do ressentimento. Ele também nutriria um ódio por ele se o mesmo tivesse acontecido com ele.

— Poderíamos visitar essas ruínas outro dia — diz Lyra — Mas eu mesmo não tolero muita poeira, mas se souber de outros lugares legais em Violet, não nos importaríamos se você fosse nosso guia turístico.

Eu me importaria! — intervém Pierce.

— Vamos parar de picuinha, irmão — censura Luca — O cara tá tentando ser legal com a gente, mas você tá azedo igual uma Nomel Berry.

Pierce resmungou e cruzou os braços. O Meowth no colo de Lyra miou e voltou a mirar Aleks com seu único olho bom, bem lá no fundo o idol ele sabia que tentar consertar tudo o que havia acontecido no passado entre ele e o rapaz era em vão, talvez seu irmão do meio Viktor estava correto, não dava para esperar que todos o perdoassem por coisas do passado.

— Bem — ele pegou um guardanapo e pegou uma caneta que havia em seu bolso e escreveu seu número e entregou para Lyra e depois olhou para ela e para Ren que ainda sorriam nervosamente para Aleks — Se quiserem conversar comigo, me mandem uma mensagem que eu talvez possa me encontrar com vocês…




Cassie

Cidade de Azalea, Johto

Terça-feira, 3 de maio


O clima de Azalea chegava a doer a garganta de Cassie de tão seco. A cidade estava passando por uma forte seca, o rio que cortava a cidade não era nada além de um fino regato de água cortando a cidade e o famoso Poço Slowpoke nas cercanias da cidadezinha carvoeira estava também seco.

As árvores estavam quase sem folhas e o chão de terra batida apresentava rachaduras, além do mormaço que nem fazia parecer que era primavera, mas sim o pior dos verões. A seca já durava fazia meses pelo que ela tinha ouvido falar dos habitantes locais e que de dois meses para cá, uma empresa (que na verdade era a Equipe Rocket em disfarce) havia se realocado para ali para lidar com a falta de água, desviando uma pequena quantidade do curso de um lençol freático para abastecer Azalea, tudo para que eles não desconfiasse do que acontecia por debaixo dos panos nas galerias do Poço Slowpoke.

Cassie não entendia muito bem, mas por ordens superiores, ela e Chadwick tinham que coletar caudas de Slowpoke. Cortar as caudas de centenas de Slowpoke todos os dias e extrair o líquido oleoso e adocicado delas e, ao final do dia, enviar para o laboratório improvisado da Doutora Veronika, a cientista-chefe da organização. Qual era o intuito? Ela e seu parceiro ainda não sabiam, mas ela estava ficando exausta de caminhar pelos túneis subterrâneos e cortando caudas de Slowpoke e espremê-las como laranjas em um tonel transparente e ela estava a poucos dias ali, mas tudo já estava ficando bastante monótono.

— Sabe o que é pior que ficar cortando cauda de Slowpoke? — diz Chad enquanto se sentavam num tronco coberto de musgo, dividindo uma única garrafa de refrigerante e comendo alguns onigiri da loja de conveniência local, era a hora do almoço de ambos se é que dava para chamar o horário de cinco da tarde de “almoço” — Ter que encarar eles. O. DIA. IN-TEI-RO!

— Ah, vai, eles são bonitinhos — diz ela — Tem uma carinha de tapados. Tipo, o que será que passa no cérebro deles?

— Talvez nada — responde o colega. — Nem sei por que cortamos as caudas deles. Tipo, lá no exterior isso custa uma grana preta, poderíamos ter dinheiro o suficiente para, sei lá, comprar o prédio da Silph Co. em Saffron, mas não, a cientista maluca tá nos obrigando a espremer o suco da cauda deles para uma das maluquices dela.

— Queria saber para o que ela tá usando aquilo — fala a recruta da Equipe Rocket.

— Eu também — uma terceira pessoa se junta a eles, era Langley, o colega cientista meio nerdola dos dois recrutas — Eu tô desde a três horas da manhã acordado e operando no laboratório improvisado da doutora. É a minha primeira pausa nesse dia.

Cassie olhou para Langley e ele estava abatido, ele tinha olheiras escuras por trás dos óculos de lente grossa, seus cabelos cor de berinjela estavam despenteados e o jaleco estava puído e sujo, ele não tinha descansado um minuto sequer nas últimas quatorze horas ao que parecia. Até seu pequeno Ditto parecia exausto, já que seu corpo gelatinoso mal conseguia sustentar e derretia em gosma rósea sobre o ombro de seu treinador.

— Uau, nerd, você está com uma carinha patética — ela disse, pegando um onigiri e entregando ao colega de equipe — A cientista maluca te fez trabalhar esse tempo todo?

— Não só eu, a equipe toda — ele bocejou antes de morder o primeiro onigiri — Os outros cientistas estão tentando separar e sintetizar todas as substâncias e sei lá mais o quê do óleo que vocês extraem dos Slowpoke. Ainda não sei o que a doutora quer com isso tudo.

— Tem algo de especial nessa substância, Langley? — perguntou Chadwick.

— Ao que sei, os Slowpoke tem células regenerativas muito boas, eles podem perder a cauda e ela irá se regenerar de duas a quatro semanas — ele explica — e os nociceptores de um Slowpoke são tão lentos em processar informação para o cérebro do Pokémon que ele pode levar um dia inteiro para perceber que se machucou e processar a dor, mas quando ele processa tal dor, ele já se curou por conta da habilidade de regenerar-se.

— Uau — diz Cassie impressionada, ela sabia que Langley era esperto, mas todas aquelas palavras complicadas faziam-o parecer um gênio.

— Mas as pessoas comem cauda de Slowpoke, certo? — indaga ele. — Tenho uma tia que viajou para Kalos e já comeu cauda de Slowpoke cozida no vapor ao molho de Roseli Berry. Aqui em Johto e em Kanto o comércio disso é proibido por conta de leis de conservação ambiental fora o tabu, mas uma única cauda de Slowpoke chega a custar um milhão de ienes.

— Um preço meio caro — diz o cientista — Mas o valor nutricional é zero. O que dá gosto à cauda é a substância oleosa e adocicada presente, deixa a língua toda dormente, é isso que geralmente atrai os Shellder.

— Sempre me perguntei isso — diz Cassie limpando alguns grãos de arroz de sua cara — Shellder sempre mordem a cauda dos Slowpoke e isso engatilha a evolução deles para Slowbro. O Shellder papa esse coiso da cauda do Slowbro e o Slowbro fica sobre duas patas e os pensamentos deles ficam mais rápidos, não é?

— É por quê o Shellder injeta uma hemo-neurotoxina no sistema nervoso do Slowbro — Langley continua explicando — É um mutualismo parasita. O parasita, o Shellder, ganha sua comida e proteção do Slowbro que em troca, agora, pode pensar melhor e se locomover mais rápido.

— Você é bem esperto, hã — analisa Chadwick, dizendo o óbvio.

— Eu fiz algumas cadeiras em Biologia Pokémon, Bioquímica e outras matérias quando estava na Universidade de Celadon — ele disse — Minha tese era nas células-tronco do Ditto e como isso poderia ser útil para reconstruir órgãos humanos e de Pokémon, tecidos danificados e tudo mais, mas meu orientador achou que isso era longe demais e que eu estava infringindo algum limite ético e, bem, aqui estou eu: trabalhando até meus ossos cansarem para a Dra. Veronika e seus inventos malucos.

Ele soltou um suspiro.

— Bem, somos três fracassados — disse Chadwick — Eu não consegui nem vencer meu oitavo ginásio e me juntei a Equipe Rocket no dia que invadiram a Silph Co.

— Bem, eu desisti antes de conseguir a minha quinta insígnia — fala Cassie — Eu entrei para a Equipe Rocket durante aquela coisa toda envolvendo o tráfico de crânio de Marowak, mas nunca cheguei a participar de nada até agora. Arceus, eu queria voltar a fazer nada no QG, é melhor que cortar cauda de Slowpoke.

Os três suspiraram, sentados ali naquele tronco.

— Bem, se eu pudesse eu ainda desafiaria os ginásios, mas aqui em Johto — diz Chadwick — Se não tivessem confiscado todos meus Pokémon e me dado esse Mankey, aposto que eu lavaria o chão com os ginásios de Johto.

— Eu nunca fui muito fã de batalhas de ginásio. Ou batalhas no geral. — diz Langley — Desde novo eu sempre quis participar de outra coisa, mas nada me parecia me atrair, então só me voltei para a pesquisa, mas não é algo que eu também seja muito apaixonado.

— Ah, para, Langley — Cassie acotovela-o — Talvez a sua praia nem seja ser um pesquisador, cara. Tu é um nerd, mas talvez seu coração está em outro lugar, eu sei que o meu tá é nos concursos. Eu queria muito me inscrever no que vai ter em Azalea no fim do mês. Quem sabe você encontre algo além de fazer experimentos e mexer em frascos e olhar microscópios.

— É, quem sabe… — o cientista dá de ombros — Bem, se conforta vocês, parece que teremos uma pausa nos trabalhos pela próxima semana ou na outra por que a doutora Veronika e o Próton querem fazer uns testes de campo e querem que os outros recrutas fiquem longe. 

— Testes de campo? — indaga Cassie, curiosa.

— Eles vão testar o quê?

— É isso que eu quero saber — responde Langley.

— Ei, ei cabeças de gelatina! — gritou um dos oficiais do alto escalão que vinha da direção do túnel secreto — Voltem para o Poço, o trabalho não acabou! Proton quer ver aquelas pilhas de caudas cortadas o quanto antes. Andem, andem, andem!

— Affe! — os três reclamaram em uníssono.


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