sexta-feira, outubro 27, 2023



Silver

Laboratório do Professor Elm, New Bark, Johto

Terça-feira, 26 de abril

O laboratório do Professor Elm era localizado nos limites da cidade de New Bark. Cataventos  eólicos rodavam suas pás ao longe, as lâminas de grama farfalhavam e as pétalas das cerejeiras faziam sua quilométrica, era um cenário primaveril bonito até, mas não era algo com o qual o ruivo perderia tempo apreciando, ele só precisava do momento exato para adentrar o laboratório do professor e sair sem que fosse percebido.

Do topo de uma árvore, não longe dos muros do laboratório, ele conseguia avistar todo o laboratório e suas amplas janelas. Ele tinha apenas dois objetivos naquela simples missão: pegar um inicial e a Pokédex. Com tudo concluído ele partiria para a próxima parte de seu plano complicado e seguiria viagem, sozinho, sem que ninguém o incomodasse.

Ele havia chegado a New Bark pela manhã de ônibus, ele tinha dinheiro suficiente consigo para uma passagem, mas depois disso partiria a pé para economizar o que havia furtado da caixa registradora daquela konbini em Mahogany. Ele poderia passar as noites e fazer sua higiene e refeições nos Centros Pokémon e comprar aquilo que fosse necessário em PokéMarts, tudo que pudesse economizar de dinheiro viria de grande ajuda para Silver.

Ao ver que o professor não estava no laboratório e que parte de sua equipe havia saído para almoçar, ele aproveitou e guardou seus binóculos e desceu da árvore em um salto que havia aprendido em um dos muitos treinamentos estafantes sobre a vigília vampírica de Sird. Ele não sabia se daria certo, mas ele havia conseguido cair de pé sem destruir os joelhos ou arruinar a coluna. Caminhando sem fazer barulho e observando onde estavam posicionadas as câmeras, ele pegou uma pedra e acertou cada uma em seu ponto cego danificando-as para que ele não fosse pego no ato.

Depois de rodear o muro umas duas vezes para certificar-se, ele caminhou pelos fundos do laboratório, pela entrada de entregas. Diferente de muitos laboratórios de pesquisa Pokémon de autoridades de renome como o Professor Samuel Carvalho em Kanto, o do Professor Elm não dispunha de uma grande e vasta área de campo aberto com habitats específicos onde os Pokémon, muitas vezes depositados por treinadores em seus boxes nos Centros Pokémon, poderiam ficar ao ar livre. Isso acabava sendo, de certa maneira, uma vantagem para Silver, não haveria ninguém para testemunhar seu crime, ele poderia entrar e sair sem ser percebido. Tudo estava perfeito!

Com cautela, indo pelas partes mais escuras dos fundos do laboratório ele caminhou até a porta que, por descuido de algum estagiário talvez, estava destrancada e escancarada. Ele notou, escondido, atrás de uma árvore uma câmera de segurança, com uma pedra em mãos e uma mira quase precisa, ele havia conseguido acertar o aparelho na terceira tentativa quebrando-o. Mel na chupeta, ele poderia entrar sem que o notassem.

Assim que adentrou o laboratório ele notou o quão amplo era o prédio por dentro. Tudo bem que ele havia entrado pela área de entregas, onde havia caixas e engradados, mas ele já conseguia ver a sofisticação tecnológica do lugar só de ver uma máquina como as que os Centro Pokémon usavam para curar em uma das salas pela qual passou.

Em outra sala pela qual passou, havia blocos de argila e arenito com uma escrita estranha, além de equipamentos de som, outra que havia béqueres e bicos de Bunsen assim como microscópios e lâminas de vidro, supercomputadores e até mesmo equipamentos que ele nunca havia visto em sua vida, mas nada que o interessasse de fato. Ele continuou vagando até que chegara em uma sala mais receptiva, com um grande sofá, prateleiras com diferentes livros e revistas, um computador e até um televisão de LCD de 42’’ com um Nintendo Switch no docking, tudo ali gritava que era ali que o Professor Elm fazia a distribuição dos iniciais aos novos treinadores, a sala era um jeito de deixá-los confortáveis durante a primeira escolha de suas jornadas, que muitas vezes eram uma das mais difíceis.

Nas paredes, havia muitas fotografias do Professor Elm, um homem desajeitado em seus trinta e poucos anos, com cabelos castanhos que pareciam estar recuando, o que futuramente resultaria em uma calvície feia, ao lado de uma mulher jovial de cabelos loiros mel e um estilo despojado e colorido por baixo de um jaleco branco, possivelmente sua esposa, conforme a aliança no dedo sugeria. Em todas as fotos, o casal estava ao lado de treinadores iniciantes e seus Pokémon, mas a que mais chamava a atenção naquela parede era uma bem grande, emoldurada relativamente recentemente, mostrando o casal de cientistas ao lado de um menino que se assemelhava muito à mulher, mas com a mesma expressão ausente do professor, provavelmente sendo filho dos dois. Na moldura da foto havia o nome do garoto: Danyel.

Voltando ao foco de sua missão, ele foi em direção ao centro daquela sala onde uma espécie de cúpula de vidro cobria uma plataforma onde três Pokébolas repousavam, tranquilas. Ele estava tão perto de seu objetivo, tudo estava bom, bom demais para falar a verdade. Ele foi até a cúpula e viu, na plataforma, que havia um botão que fazia a mesma retrair-se, permitindo melhor acesso às Pokébolas, com um leve toque ele apertou o botão e viu a cúpula subir.

Antes de fugir do QG em Mahogany ele havia pensado bem em que Pokémon iria escolher, ele não queria um Cyndaquil, por mais que fossem ofensivamente melhores, ele sentia que um Pokémon tímido atrapalharia-o ao invés ajudá-lo em sua missão. Totodile eram balanceados, uma escolha mais volátil, mas ele sabia que iria se zangar fácil com o crocodilo só pelo fato de ser agitado e sempre alegre, ele não precisava de distrações, precisava de um Pokémon que pudesse oferecer o suporte necessário para si e bem, a única escolha restante era Chikorita que, apesar de muitos não verem o inicial com bons olho, o ruivo enxergava um certo potencial em um Pokémon que era tido por muitos treinadores como um canhão de vidro nos desafios de ginásio de Johto.

Também é o Pokémon dele, sua mente retornou a um momento antes de ter fugido de Mahogany, quando ainda era apenas mais um potencial recruta no QG, um dos Mareep no rebanho de Archer. Ele só tinha uma única forma de lazer naquele lugar, os mangás que lia, e em um deles o protagonista central possuia como parceiro um Chikorita. Era uma das razões para ele querer escolher aquele inicial para si.

Apesar de não haver nenhum indicativo claro de qual era qual, haviam símbolos mostrando os tipos de cada Pokémon próximo às bolas. Uma gota de água indicando Totodile, uma chama para Cyndaquil e para Chikorita uma folha. Instintivamente ele pegou a Pokébola e agarrou-a firmemente em sua mão como se fosse um tesouro precioso.

— Agora onde ficam as Pokédexes? — perguntou ele procurando por algum sinal da enciclopédia eletrônica, mas nenhum sinal do aparelho naquela sala.

Antes que ele pudesse fazer algo ele ouviu passos no corredor, ele desesperou-se e viu a janela aberta e aproveitou a rota de escape ali e pendurou-se ali, abaixando, evitando cair da altura que estava, com sorte ele não seria visto e se pulasse do jeito certo iria conseguir escapar dali sem problemas, mas no momento ele se via em um beco sem saída, ali segurando-se na beira da janela, tentando firmar os pés em um sulco na parede caiada.



Lyra

Residência dos Winterfeldt, New Bark, Johto

Terça-feira, 26 de abril


Lyra havia ficado boquiaberta ao ver sua professora de literatura em sua cozinha, ali, com seu pai. Eles estavam saindo? Era essa a razão pela qual ele estava voltando tão tarde para casa nas últimas semanas? Eram tantas perguntas pipocando na mente da menina que ela já nem tinha tanto apetite para pegar seus hashi.

Ela não tinha problema nenhum em ver seu pai saindo com outra mulher, ele era um homem viúvo em seus trinta e sete anos, ele tinha todo o direito de seguir em frente e encontrar um novo amor, mas ver que era alguém com quem Lyra convivia todos os dias, uma professora a qual ela via na escola todos os dias e com quem havia conversado não fazia nem uma hora era de cair o queixo, mas se seu pai estava feliz com isso, quem era ela para julgar? Todos mereciam ser felizes, viver das mágoas do passado apenas corroía a alma e envenenava o coração, ninguém poderia enlutar para sempre, às vezes o certo era seguir em frente e se permitir amar de novo.

— Crianças, essa é a Paula — Frank, seu pai, apresentou a professora para eles, embora Lyra já a conhecia desde o início do semestre em março.

— Srta. Specht?! — ela esboçou choque e surpresa.

— Oi, Lyra — ela disse, sentando-se à mesa e se servindo de um pouco de tamago kake gohan — Já falou com seu pai sobre querer sair em uma jornada?

— Jornada? — ele repetiu a palavra — Era isso que você queria me mostrar da escola?

Lyra desistiu de pegar os hashis naquela altura. Ela tirou o papel amassado do bolso de seu cardigã e olhou nos olhos do pai, entregando-lhe a autorização. O pai de Lyra leu o papel, já bem amassado de tanto ficar no bolso da filha.

— Poxa, filha, por que não me falou antes? — disse Frank Winterfeldt, um tanto surpreso.

— Não é culpa minha — respondeu ela. — O senhor tem voltado muito tarde do trabalho para casa e... bem, quase não tenho tido tempo para conversar com o senhor. Quando eu acordo, você já se foi, e quando estou indo dormir, você já chegou...

— Aonde você tem ido tanto? — perguntou Harper, repousando seu Nintendo Switch sobre a mesa, talvez por estar sem bateria naquele momento. — Foi sair para namorar?

Frank coçou a nuca, o rubor em suas bochechas era visível. Paula, a senhorita Specht, permaneceu calada. O silêncio respondeu às perguntas dos dois adolescentes.

— Desde quando vocês dois andam se encontrando? — perguntou Lyra, intrigada, afinal ela não sabia muito sobre sua professora de literatura nem como ela e seu pai haviam se conhecido.

— Bem... — Frank coçou a nuca e olhou para um canto da cozinha. — Foi durante a última reunião de pais e professores. Conversamos um pouco depois da reunião e acabamos indo a um bar tomar umas.

— Queríamos ter contado antes — disse a srta. Specht. — Não quero que pensem que estou vindo e substituindo a mãe de vocês; não tenho essa intenção. Sei como é difícil perder uma mãe, então espero que não me vejam com maus olhos só porque estou namorando o pai de vocês.

Lyra estava bem com aquilo, entendia que seu pai havia encontrado um novo amor. A senhorita Specht era uma mulher gentil e carinhosa em sala de aula com seus alunos, e talvez essa persona se estendesse para além dos muros da escola. Para Lyra, estava tudo bem. Harper, por sua vez, franziu uma das sobrancelhas, levantou a mão e disse:

— Hã, eu não sou filho do Frank — apontou para o homem, que lhe deu um meio sorriso. — Sou apenas um amigo da família. Vim almoçar porque o sr. Winterfeldt me buscou na escola; sempre venho aqui depois das aulas.

— Oh... — disse a professora, surpresa. — Eu achei que… É que os nomes combinam e os olhos de vocês são bem parecidos, a mesma cor... Eu achei, céus, achei que fossem irmãos, ledo engano da minha parte. Peço desculpas.

— Acontece — riu Lyra. — Mais do que o normal.

— Eu já me acostumei à essa altura — suspirou Harper. — Mas fazer o que, né? Lyra e o sr. Winterfeldt são praticamente uma família para mim.

A Senhorita Specht riu.

— Bem, a conversa parece boa, mas acho que precisamos falar do que importa aqui — disse o pai de Lyra, pegando uma caneta do nada e assinando a permissão para que ela pudesse sair em jornada. — Quando você quer começar a sua jornada? Posso ligar para o Elm agora, se quiser; ele me deve um favor desde que fiz um trabalho para ele no mês passado.

— Que empolgação — riu a professora.

— Bem, eu não tenho nada pronto... — disse Lyra. — Eu nem sabia como iria te falar sobre isso…

— Acho que hoje ainda podemos arrumar tudo — disse o pai, pensativo, tamborilando a caneta contra o queixo cinzelado. — Não é todo dia que minha filhota sai em jornada, não é? Harper, poderia me fazer um favorzinho e ir ao mercado para mim?

— Mas por que eu? — protestou o garoto. — É ela quem vai viajar, não eu!

— Calma, rapazes, uma coisa de cada vez — disse a professora. — Podemos todos, depois do almoço, ir ao Professor Elm e, na volta, passar em uma loja de camping na cidade para comprar tudo que Lyra irá precisar.

— Não precisam fazer nada disso, pessoal — disse Lyra, sentindo-se um pouquinho sobrecarregada, mas também animada. Todos pareciam querer embarcar na ideia de se juntarem naquela jornada, auxiliando Lyra em seus primeiros passos. — Vamos devagar.

O pai sorriu e acariciou a cabeça da filha carinhosamente.

— Filha, isso é importante para você, e nós queremos estar presentes para apoiá-la. Não é todo dia que uma treinadora Pokémon começa sua jornada, e não queremos perder nenhum momento especial.

A srta. Specht concordou.

— Ele está certo, Lyra — disse Paula com os hashi em mãos — Uma jornada Pokémon é uma experiência única, e ter seus amigos e família ao seu lado tornará tudo ainda mais memorável.

Após o almoço, todos se prepararam para a visita ao Professor Elm em seu laboratório, era um momento importante em família. Lyra e o pai reuniram algumas coisas que podiam ser importantes para a jornada dela, providenciando com o que podia. Harper correra no mercado e trouxera tudo que Frank havia requisitado, todos estavam prontos.

Lyra havia se trocado, ela não poderia sair usando uniforme escolar. Ela havia pego uma blusa vermelha de capuz branco e vestido um macacão jeans por cima. Os cabelos, presos em marias-chiquinhas, foram escovados, ela havia prendido parte da franja com um ou outro clipe, ela já estava pronta, havia até pegado uma bolsa velha que estava em seu guarda-roupa pegando poeira e colocou tudo que precisava dentro dela.

Ela estava quase pronta, quase pronta para sair, mas antes de tocar a maçaneta ela viu na cabeceira da cama algo que ela não tocava há um bom tempo, uma boina branca com um grande laço vermelho, ela estava ali desde janeiro, Lyra nunca havia experimentado ela, para falar a verdade. Era um presente de um certo alguém, um tanto apreensiva, ela pegou o chapéu e colocou na cabeça.



Agora sim ela estava pronta para sair. Ela caminhou rumo à porta do quarto, mas ouviu algumas batidinhas, abrindo a porta ela viu que era sua avó, apoiada em sua bengala e com uma caixinha em mãos. Ela havia voltado e esboçava um sorriso.

— Soube que sairá em jornada, minha querida — disse a avó — Você cresceu tanto, Lyra. Lembra tanto ela.

Ela. A avó referia-se à mãe de Lyra, Theresa, que já havia partido fazia dez anos. Sempre havia comentários de como ela se parecia em muito com a mãe, os mesmos cabelos castanhos, os olhos cor de avelã.

Lyra deu um meio sorriso.

— Queria que ficasse com isso — disse a avó entregando uma caixinha aveludada para ela, do tipo que se guardava alguma joalheria como um anel ou um colar — Eles pertenciam a Theresa, achei que seria bom ter algo da sua mãe consigo.

Lyra havia aberto a caixinha e viu um par de brincos em formato de estrela, dourados. Ela, movendo a boca, mas sem emitir nenhum som, agradeceu à avó, abraçando-a.

— Tenha uma boa viagem, coração — disse ela — Você vai conquistar muita coisa ainda.

A garota secou uma pequena lágrima que se formava no canto do olho, acenou para a avó e foi de encontro ao pai e a Paula, que esperavam na caminhonete com Harper. Sua jornada começava hoje, ela não podia nem crer.


Silver

Laboratório do Professor Elm, New Bark, Johto

Terça-feira, 26 de abril


Ele não podia crer que estava pendurado a alguns metros de altura do chão. Aquela parte do laboratório havia sido construída sobre palafitas na escarpa da colina e ele não sabia o que era pior: cair de metros de altura ou ser pego.

Logo abaixo, caminhando ao redor do laboratório estava um Pokémon canino grande de pelagem roxa com uma mandíbula proeminente com duas grandes presas que despontavam, pontiagudas. Era um Granbull, um Pokémon que atacava com uma potente mordida se fosse irritado. Era um Pokémon incompetente como cão de guarda, muitas vezes só sendo colocado para intimidar, já que não possuía um faro dos bons e era bem tímido, diferente de outros Pokémon cães como Arcanine e Houndoom.



Merda — murmurou enquanto se segurava ali no peitoril daquela janela, apoiando os pés em um dos sulcos da parede caiada, se tivesse sorte poderia escapar dali antes do buldogue percebê-lo.

No lado de dentro o Professor Elm acompanhava uma família com os filhos.

O pai era um homenzarrão musculoso e torneado, de cabelos pretos que pareciam não ter visto uma tesoura há um bom tempo e cujas camisa parecia que iria rasgar a qualquer momento por conta dos músculos, olhos frios e de uma tonalidade cinzenta, atravessando o lábio superior e perto do pescoço haviam algumas cicatrizes. A mãe, por sua vez, era uma mulher loira e baixa, magra, usando um cardigã sobre um vestido com estampa de girassóis, o filho era até parecido com o pai exceto pela coloração dos olhos que eram de um tom avelã.

A filha do casal que surpreendeu, era a garota de uma hora atrás. Ela não usava o uniforme escolar de antes, ela vestia uma blusa vermelha com um capuz branco por baixo de um macacão jeans, seus cabelos estavam em um par de marias-chiquinhas presas por fitas, além de uma boina horrorosa.

— Fiquei surpreso quando me ligou, Frank — disse o cientista, com as mãos no bolso — Eu estava saindo para almoçar com a Liz, mas do nada recebi seu telefonema e tive de correr para o laboratório.

— Espero que não tenhamos interrompido o almoço com sua esposa — disse a mulher loira — É que viemos tão de repente e…

— Não, está okay — Elm deu uma gargalhada de leve — Eu já tinha algumas visitas marcadas para hoje, então fizeram bem em ter vindo. Lyra, não é?

A garota assentiu com a cabeça.

— Está preparada para receber seu primeiro Pokémon? — perguntou Elm.

— Eu ainda não sei bem qual irei escolher — disse ela coçando a nuca, apreensiva, Silver a achou patética, ele já havia vindo com uma escolha clara em mente.

— Bem, para a sua sorte, temos um bom leque de opções aqui — ele guiou-a até a plataforma onde as Pokébolas estavam depositadas — , eu não lembro de ter deixado a cúpula aberta. A Pokébola do Chikorita também não está aqui. A garota que havia combinado de vir buscar seu inicial não deveria vir até às quatro da tarde, são duas e meia agora.

Elm checou o relógio de pulso, do canto da janela Silver sentiu um frio subir pela espinha. Abaixo, na colina, o Granbull latia e tudo que ele havia planejado até ali havia ido para os ares. Ao ouvir a comoção dos latidos do buldogue, o cientista junto de Lyra, foram à janela, a sua família também foi junto.

Silver arregalou os olhos, ele se desprendeu do peitoril da janela, ele não tinha escolha, ele havia sido pego. O Granbull, zangado, começou a latir conforme o garoto, em um pulo arriscado, descia ao chão.

— Liguem para a Policial Jenny! — gritou Elm ao ver ele correr — Ele pegou.. Ele roubou o Chikorita.

Caindo sob um arbusto, ele começou a correr dali, por sorte não havia se machucado. Com a Pokébola em mãos ele partiu dali, mas o Granbull começou a persegui-lo, instigado a morder aquele invasor. O cão, espumando pelos cantos da boca, correu em suas quatro patas, tentando alcançar Silver que ia em direção ao muro, escalando o mais rápido que podia. Ele precisava fugir e rápido.




Lyra

Laboratório do Professor Elm, New Bark, Johto

Terça-feira, 26 de abril


A polícia havia levado meia-hora para chegar ao laboratório. O professor Elm estava quase arrancando os fios de seu ralo cabelo de tão nervoso que havia ficado, ele murmurou e murmurou. Lyra estava compadecida do cientista, ver um Pokémon o qual ele tinha intenção de dar para algum jovem treinador ser roubado desse jeito por um delinquente juvenil era de quebrar o coração.

O laboratório do Professor Elm estava repleto de tensão e preocupação quando o grupo testemunhou o crime. Após descreverem o garoto e o que acontecera, a polícia iniciou a investigação do restante do laboratório para verificar se nada mais havia sido roubado. Frank, o pai de Lyra, ofereceu-se para ajudar, mas a Policial Jenny recusou, deixando claro que era um assunto para a polícia resolver.

— Perdão por termos que passar por isso — disse o cientista, Elm, com tristeza em seus olhos — Eu queria que o início de sua jornada fosse mais tranquilo, Lyra. Sinto muito.

— Não se preocupe — respondeu Lyra, embora por dentro se sentisse abalada com a situação — A polícia vai encontrar aquele garoto.

— Assim espero — disse Elm, suspirando — De qualquer forma, agora que só restam dois Pokémon, qual você escolherá?

Elm pegou uma das Pokébolas, e dela surgiu um pequeno Pokémon com pelo azul-esverdeado na parte superior do corpo, focinho pontudo e a parte inferior em um tom de creme. Seus olhos semicerrados denotavam timidez, enquanto quatro manchinhas circulares vermelhas nas costas brilhavam, liberando chamas como espinhos.

— Este é Cyndaquil — apresentou o Professor Elm — Um Pokémon do tipo Fogo, como você pode ver. Ele é uma escolha perfeita se você busca um Pokémon mais ofensivo.

Em seguida, o cientista liberou outro Pokémon, um pequeno crocodilo azul com uma marca em V em seu abdome e protuberâncias vermelhas nas costas. Seus olhos vermelhos brilhavam, e sua boca exibia dentinhos afiados. O crocodilinho demonstrava empolgação, pulando de alegria.

— Esse é Totodile, do tipo Água — explicou Elm — Ele é uma escolha popular para treinadores em busca de uma equipe mais balanceada. Além disso, eles são muito animados, e sua equipe nunca será a mesma com ele por perto.

Lyra se agachou e estendeu a mão, permitindo que os Pokémon se aproximassem. Cyndaquil estava apreensivo e se escondeu atrás do professor, enquanto Totodile, de forma carinhosa, esfregou seu corpo contra Lyra, como se a escolhesse.

— Que curioso — comentou Elm — Ele é quem te escolheu. Talvez algo grandioso surja dessa conexão entre vocês. Então, vai querer ficar com ele?

Lyra pegou Totodile nos braços, e o crocodilinho, alegre, se remexeu. Ela olhou em seus olhos e, de algum modo, soube que ele seria seu parceiro.

— Sim — disse ela, com um sorriso sincero.

— Então, agora minha querida, você é uma treinadora oficialmente — Frank disse, abraçando a filha.

Harper sorriu e Paula se aproximou da menina e de seu novo Pokémon. Todos estavam ali, unidos. Lyra pegou a polaroid de sua bolsa e entregou-a ao Professor Elm:

— Acho que uma foto agora seria uma boa ideia — sugeriu — Professor, poderia tirar?

Elm assentiu e pegou a câmera, capturando uma foto da família e do novo membro, o Totodile de Lyra. A imagem impressa não ficou perfeita, mas era uma lembrança valiosa para colocar em seu caderno de anotações.

O professor entregou a ela também uma Pokédex, uma enciclopédia eletrônica com tela touchscreen, fácil de usar. Lyra recebeu cinco Pokébolas e algumas poções para começar sua jornada bem equipada.

Do lado de fora, o vento soprava na direção oeste, fazendo as pás das turbinas eólicas girarem. Pétalas e folhas dançavam no ar, enquanto Pidgey voavam com o sopro da brisa. Lyra estava afastada de New Bark, já conseguia ver as colinas silenciosas, os cataventos eólicos e casas bucólicas entre as árvores. Seu coração estava acelerado, mas ela sabia que estava pronta para ser uma treinadora Pokémon e realizar seu sonho.

Ela remexeu em sua bolsa e pegou uma caixinha de veludo que sua avó lhe dera, colocando os brincos de sua mãe nas orelhas.

— Vou realizar o nosso sonho, mãe — sussurrou para si mesma, lembrando-se do amor de sua mãe por Pokémon — Serei uma campeã, como te prometi.



Silver

New Bark, Johto

Terça-feira, 26 de abril


Sem olhar para trás, ele se afastou do laboratório. Sua respiração estava ofegante, e seu peito parecia uma bateria em um show de rock n' roll, com as batidas aceleradas de seu coração. Para despistar qualquer sinal de que a polícia viria atrás dele, ele se dirigiu a um prédio abandonado, tendo sorte de não ser visto por ninguém até chegar ali.



No prédio, ele encostou a cabeça contra uma parede e encarou o teto. Sua respiração pesava, e o calor e o suor fizeram seu cabelo grudar nas têmporas e nas bochechas; ele precisava urgentemente de um banho.

Andando pelo prédio, notou que a eletricidade não havia sido cortada, pois conseguiu ligar uma das luzes no corredor. Parecia ser um prédio de apartamentos abandonado, possivelmente condenado e prestes a ser demolido.

Embora cansado, continuou até chegar a um apartamento ainda mobiliado. Talvez a família que morava ali não tivesse tido tempo de pegar suas coisas e partir quando anunciaram a demolição. Adentrou um dos quartos e abriu a cômoda, encontrando roupas que ainda lhe serviam. Pegou algumas peças e as colocou em sua mochila.

Chegando ao banheiro do apartamento, percebeu o motivo pelo qual o prédio estava condenado. A água havia arruinado sua estrutura, e as paredes estavam cedendo devido à umidade ao longo do tempo. Porém, Silver não se importou com os detalhes do prédio abandonado. Ligou a água quente e deixou a banheira encher enquanto retirava suas roupas para o banho. Pegou uma toalha que ainda estava em boas condições e a pendurou no gancho da parede desgastada.

Antes de entrar na banheira, olhou-se no espelho, algo que não costumava fazer com frequência. Havia crescido bastante nos últimos três anos. Seu corpo passara por mudanças físicas significativas, com pelos que haviam crescido na região das axilas, do peito e do tórax e um pouco mais para baixo.

Notou também que seu físico havia mudado bastante. Antes de ser sequestrado pela Equipe Rocket, lembrava-se de que seu corpo era franzino, magérrimo, ao ponto de poder contar suas costelas. Após tanto treinamento físico sob a vigilância de Sird e Proton, além da alimentação no refeitório, havia adquirido definição muscular, com um peitoral começando a se destacar e um pouco de abdômen com alguns gominhos, além de pernas e braços mais musculosos. Não que se achasse saradão como o pai da garota, Lyra, mas tinha mais massa muscular do que muitos dos adolescentes que havia conhecido.

O que mais o assustava ao se olhar no espelho eram as cicatrizes que possuía. Uma na base do queixo, quase descendo em direção ao pescoço, marcas das garras de um Pokémon em um dos ombros, e uma queimadura na lateral do tórax, além de outras marcas nas costas e em um dos braços. Todas elas haviam sido resultado de punições físicas durante treinamentos, outras... Preferia não pensar muito a respeito.

O espelho condensou-se com o vapor. Na névoa branca, ele conseguia ver rostos, um rosto masculino sisudo e um feminino, mais suave. Eram os rostos de seus pais.

Patético — havia dito seu pai, ou ele imaginou que ele havia dito isso — Seu primeiro roubo e é pego assim? Na sua idade, eu teria conseguido melhor que isso...

Ele ignorou, tudo aquilo estava na sua cabeça. Apenas em sua cabeça.

Dante, como ousa me envergonhar assim? — indagou Giovanni, sua voz ecoando pela cabeça do garoto — Criei você para ser meu herdeiro e veja só, você conseguiu ser pego em seu primeiro roubo. Patético.

Ele tapou as orelhas e caminhou em direção à banheira que já começava a transbordar.

Eu tenho asco de você — continuou Giovanni — Você me enoja. Você não tem o que é necessário para ser meu herdeiro, meu sucessor.

— Eu não quero isso! — ele gritou para o vapor do banho, sua voz ecoando — Você foi derrotado. E eu vou destruir o que resta do império que você construiu!

A voz de Giovanni em sua mente se calou. Lágrimas se formavam no canto dos olhos de Silver, escorrendo pelas bochechas enquanto se misturavam à água quente da banheira. Ele deslizou para dentro da água e se permitiu chorar um pouco, ser frágil e vulnerável.

Ele ouviu o som de passos pequenos indo em direção ao banheiro. Havia esquecido a porta aberta, e quando levantou a cabeça e viu duas pequenas figuras na entrada do cômodo, seus olhos arregalaram. No entanto, quando ambas as criaturas se tornaram visíveis em meio à névoa, ele se tranquilizou. Eram seu Sneasel e seu Chikorita, dois Pokémon que ele havia roubado.

A doninha pegou algo em um dos armários do banheiro e entregou ao treinador: uma esponja. Chikorita empurrou algo em direção à água, uma garrafa de shampoo e outra de condicionador, além de sais de banho. O saurópode olhou para seu treinador e deu um sorrisinho, sacudindo sua folha ao ar, deixando que um cheiro agradável e adocicado preenchesse o ambiente.

Está tudo bem se permitir chorar, meu filho — uma voz disse em sua mente, era a de sua mãe, embora ele tenha apenas imaginado-a — Seja gentil consigo mesmo, Dante.

A voz de sua mãe, assim como a de Giovanni, minguou. Silver estava sozinho no banheiro, não totalmente, ele tinha seus Pokémon consigo, conseguia sentir o frio de Sneasel e o aroma fragrante de Chikorita.

Após o banho, ele enrolou-se na toalha e caminhou pelo apartamento vazio, apenas em suas boxers após se secar. Preparou uma refeição simples com cup noodles e a água que aqueceu na chaleira, sentando-se na sala e mexendo em seu PokéGear. Precisaria sair de New Bark nas primeiras horas da madrugada para evitar qualquer encontro com a polícia.

Sneasel ronronava perto dele, seu pelo exalando um ar frio. A doninha havia se aproximado dele, talvez Annie nunca tivesse se permitido conectar com aquele Pokémon, e por isso ele se mostrava tão dócil. O mesmo valia para Chikorita, que perfumava todo o ambiente com seu aroma fragrante e calmante. Ele já tinha dois Pokémon e poderia começar a treinar para se tornar um treinador forte o suficiente para derrotar e desmantelar a Equipe Rocket, começando pelo desafio dos ginásios na cidade de Violet, sua próxima parada.

Ele recostou a cabeça contra o sofá, mas antes que pudesse relaxar, ouviu sons. Passos e vozes. Desta vez, não eram coisas da sua cabeça. Pegou seu canivete da mochila e se preparou, Sneasel eriçou os pelos das costas e chiou, com as garras prontas para desferir um golpe, o mesmo valia para Chikorita, que batia os pés contra o piso.

Caminhando cautelosamente, segurou o canivete e foi em direção ao som. Pela entonação das vozes, não parecia se tratar de policiais, mas de adolescentes, um menino e uma menina pelo que pôde ouvir.

— Tem alguém aí? — a voz masculina perguntou, com um sotaque evidente de alguém de Goldenrod, com uma entonação mais carregada.

Silenciosamente, abriu uma das lâminas do canivete e empunhou-o.

Quando viu as sombras, se preparou. Caminhando em direção à luz, viu o menino, que era bem mais alto que Silver, com um corpo esguio, porém atlético, cabelos azuis e olhos de tonalidade dourada que, na luz, pareciam ganhar um estranho furta-cor. Uma menina veio logo atrás dele, quase idêntica, talvez sua irmã gêmea, exceto que seus cabelos eram pretos e curtos, como se ela mesma os tivesse cortado, e que ela era bem baixa.

Eles só tinham mochilas consigo, não pareciam ter nenhum Pokémon visível em mãos ou acompanhando-os, e pareciam estar com medo de algo. Silver guardou o canivete, eles não pareciam ameaças, eram presas fáceis. Havia certa ingenuidade no olhar de ambos. Foi até suas coisas e rapidamente vestiu uma calça, aproximando-se dos dois irmãos.

— O que fazem aqui? — com a voz intimidadora, foi andando, Sneasel estava em seu ombro e Chikorita galgou ao seu lado, ambos Pokémon expressando certo furor, prontos para atacar se necessário.


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{ 4 Comentários... leia-os abaixo ou comente }

  1. o clássico roubo do laboratório, clássico

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  2. Me dê um treinador que escolhe Totodile uma vez e eu direi que é uma pessoa de bom gosto. Me dê um treinador que escolhe Totodile duas vezes e eu direi que nunca errou. Lyra, você está de parabéns!

    A famosa invasão do Silver ao laboratório do Elm! Cá estamos novamente. Uma passagem da história muito marcante, muito nostálgica. Eu lembro bem de como foi esse capítulo na NPJ antiga, vi que você tem reaproveitado vários fatos e detalhes, mas é evidente o quanto a sua escrita melhorou. Você já mandava bem com as descrições, mas agora elas estão muito mais precisas, tornando as cenas mais vivas. É quase como se estivéssemos presenciando tudo in loco!

    O Silver não teve nem tempo de contemplar e refletir sobre seus daddy issues, porque já foi surpreendido com os gêmeos fugitivos — que ele não faz a mísera ideia de quem são kkkkkkkkkk Cara, não tem um nesse trio aí agora que passa despercebido! Se largar eles em um shopping, eles chamam mais atenção que o Aleks que tá famosinho kkkkkkkkkk É, esse trio vai dar trabalho...

    Curioso pra saber mais sobre o passado da Lyra, e toda essa questão envolvendo a mãe dela. Será que vamos chegar a conhecê-la? Fica a pergunta, porque essas mortes assim costumam ser artifícios com grande impacto no desenvolvimento de personagens. Vamos ver o que você tem guardado na manga aqui.

    Até a próxima! õ/

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    Respostas
    1. Se Totodile uma vez é bom, duas vezes é melhor ainda! Lyra nunca erra, jamais, apenas toma péssimas decisões, mas pegar o Totodile não foi uma delas!

      Ah, sim, o roubo. Amei escrever esse pequeno crime de nosso ruivinho, não tinha como não reaproveitá-la, mas mudando uma coisinha ou outra da versão anterior e seria um grande desperdício não ter essa cena, justo uma das minhas melhores pérolas, haha.

      Daddy issues aqui não, meu compadre, temos gêmeos entre nós com tantos problemas quanto e juntos eles são um trio parada dura, vai ser bem difícil ninguém reparar neles, acho melhor eles ficarem pianinhos quando estiverem viajando, mas sabe como é, a encrenca sempre está atrás desse povinho.

      O passado da Lyra é algo que quero mais trabalhar essa temporada, principalmente tudo que envolve a mãe dela, que é uma figura um tanto misteriosa tanto para ela quanto para gente. A morte da mãe da Lyra permanecerá um mistério, mas também agirá como a pedra angular na jornada da nossa garota de marias-chiquinhas, mas por agora não vamos nos preocupar com isso.

      Mais um comentário, go go go go!

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